Estilo judaico de vestir
Desde o momento em que, no Jardim de Éden, o
primeiro homem sentiu a necessidade de cobrir seu corpo, o ato de se vestir
constitui verdadeiro guia para a elaboração de um retrato das diferentes
sociedades, seus costumes, seus valores.
Analisando as vestimentas adotadas por um
determinado povo ou grupo social, podemos diferenciar países de origem, épocas
históricas, classes sociais, estado civil, bem como seus hábitos e sua forma de
agir e pensar.
Para o Povo Judeu, as vestes sempre foram uma forma
de manter sua identidade. No período bíblico, os profetas advertiam os judeus
quando estes se afastavam de seus costumes, adotando a forma de vestir de
outros povos. Em Pessach, lê-se na Hagadá que uma das razões para os hebreus
terem sido salvos do Egito foi por não terem mudado seus trajes característicos
durante os anos que ficaram em terras egípcias.
Se analisarmos o tipo de vestimenta usada em
diferentes países e em momentos históricos, após a Grande Dispersão, no 1º
século desta Era, quando os judeus são expulsos de sua Terra e forçados a viver
como minoria no seio de uma sociedade maior, podemos discernir o nível de
discriminação e perseguição a que eram submetidos, assim como o grau de
inserção ou assimilação alcançado.
O judaísmo e as vestimentas
A história das vestimentas se inicia no momento em
que o primeiro homem passa a ter consciência de sua nudez e sente a necessidade
de cobrir seu corpo. Relata a Torá que antes de desobedecer a D'us comendo do
fruto proibido, Adão e Eva viviam nus, no Jardim do Éden, sendo-lhes
desconhecido o sentimento de vergonha. Mas, assim que pecaram e o mal passou a
fazer parte de sua natureza, sentiram-se envergonhados e quiseram cobrir o
corpo com folhas. Antes de expulsá-los do Jardim do Éden, D'us os veste com
túnicas de pele de animais.
Pode-se deduzir a importância conferida pelo
judaísmo às vestimentas através da afirmação da Mishná de que um judeu deve
vestir-se de acordo com suas posses, mas deve alimentar-se abaixo das mesmas.
Ademais, ensina nossa tradição que "A glória de D'us é o homem e a glória
do homem é sua vestimenta" (DerechEretz).
O judaísmo ensina que qualquer judeu - homem ou
mulher - deve guardar a limpeza corporal e se vestir com recato. O sábio, em
especial, tem que trajar roupas limpas e respeitáveis, pois se usar sapatos e
roupas remendados estará trazendo vergonha à sua erudição (Tratado Shabat,
114a). Os líderes comunitários também devem usar roupas adequadas à sua posição
na comunidade. O Talmud afirma que uma noiva tem um ano para preparar seu enxoval
(Tratado Ketubot, 57a), e o marido tem a obrigação de dar à mulher anualmente,
para as três Grandes Festas, um chapéu novo, um cinto, três pares de sapatos
além de outras peças de vestimentas (ibid, 64b).
Mas, alerta o Talmud, é preciso cautela para não
julgar uma pessoa apenas por sua aparência, pois nem sempre as roupas definem
quem as usa. A própria grafia hebraica da palavra roupa, begued, alerta para
isso; pois, com as letras Bet, Guimel e Dalet forma-se, também, a raiz da
palavra bagod, que significa "trair".
Na Torá há algumas leis sobre o tipo de vestimentas
que os judeus devem, ou não, usar. Um dos princípios básicos é que os homens
são proibidos de usar roupas femininas, assim como as mulheres de se vestir
como homem.
Entre as peças de vestuário masculino está o
tsitsit, que, em hebraico, significa franja. A Torá exige que todo homem judeu
use franjas - tsitsit - nos cantos de peças de vestuário que tenham quatro
pontas (Números, 15: 37-41). Este mandamento é repetido todas as vezes que recitamos
a oração do "Shemá". Os tsitsit são usados todos os dias como
lembrete ao judeu dos demais Mandamentos Divinos.
Este preceito é observado através do uso do
talitcatan - o talit pequeno - também chamado de "tsitsit", usado
diariamente debaixo da camisa, e do talitgadol, conhecido apenas como
"talit". Este último é o xale ritual no qual os homens se envolvem ao
recitar as orações matinais e em outros ofícios religiosos e que acompanha o
homem judeu ao longo de sua vida. Durante a cerimônia do casamento, recobre os
noivos para a bênção nupcial e, muitas vezes, acompanha o homem também em sua
morte, sendo usado como mortalha. Suas dimensões variam, assim como os tecidos
e tonalidades em que são confeccionados e os bordados com que são ornados.
Outra determinação bíblica sobre as vestimentas é a
proibição do uso de roupa que contenha mistura de lã e linho - shaatnez, em
hebraico. Só o Cohen Gadol, o Sumo Sacerdote, quando oficiava no Templo Sagrado
de Jerusalém, podia trajar-se com essa mistura de tecidos. Este mandamento da
Torá é um dos decretos supra-racionais, chukim em hebraico, incompreensíveis
para a mente humana. O Talmud, no entanto, oferece várias interpretações; uma
delas é relacionada à história de Caim e Abel e às respectivas oferendas que
levaram a D'us. O primeiro era agricultor e levou plantas que dão o linho,
enquanto Abel, que era pastor, levou ovelhas, de cujo pêlo se obtém a lã.
Segundo a Cabalá, assim como estes dois filhos de Adão representavam forças
espirituais opostas, que devem ser mantidas separadas, suas oferendas também
não se devem mesclar.
Outra obrigação do homem judeu é cobrir a cabeça,
principalmente durante as orações, bênçãos, dentro da sinagoga ou de outro
recinto sagrado. Esta obrigação não provém de nenhuma injunção bíblica, é um
sinal de reverência a D'us (Trat. Shabat, 156b), uma forma de reconhecer que há
Alguém acima de nós.
O costume pode ter-se iniciado na época do Templo
Sagrado de Jerusalém, pois os Cohanim usavam um turbante enquanto oficiavam os
serviços religiosos. Mas, sabe-se que na época talmúdica, todos os sábios
cobriam a cabeça. Inúmeras fontes revelam que havia aqueles que não davam mais
de quatro passos com a cabeça descoberta, "pois a Presença Divina paira
sempre sobre a cabeça" (Tratados Shabat, 118b e Kidushin, 31a). O costume
pode ter-se iniciado na época do Templo Sagrado de Jerusalém, pois os Cohanim
usavam um turbante enquanto oficiavam os serviços religiosos. Mas, sabe-se que
na época talmúdica, todos os sábios cobriam a cabeça. Inúmeras fontes revelam
que havia aqueles que não davam mais de quatro passos com a cabeça descoberta,
"pois a Presença Divina paira sempre sobre a cabeça" (Tratados
Shabat, 118b e Kidushin, 31a).
Nas gerações seguintes, o costume foi adotado por
todos os judeus, principalmente durante as orações. Como no judaísmo, quando um
costume se torna prática universalmente aceita, este adquire característica de
lei, assim, o que era um sinal de fervor e respeito se transformou em um
mandamento. Apesar de se poder usar qualquer tipo de chapéu para cobrir a
cabeça, é costume usar a kipá, nome hebraico do pequeno solidéu tradicional, em
iídiche yarmulke ou képele. Atualmente, pode-se reconhecer a que grupo
religioso um judeu pertence pelo tipo de chapéu ou kipá usado.
As mulheres, desde a época bíblica, cobrem a cabeça
em público após o casamento, já que não é permitido a uma mulher casada mostrar
seus cabelos, a não ser para o marido. O tipo de véu ou chapéu variou de acordo
com a época e a sociedade. Hoje, por exemplo, há mulheres que cobrem o cabelo
com chapéus e outras, com belas perucas.
No antigo Israel
Pode-se encontrar na Torá e nos livros dos Profetas
a descrição dos trajes judaicos da época bíblica. Os judeus usavam túnicas com
mangas, chamadas de ketonet, que chegavam aos joelhos e eram amarradas na
cintura com um cinto (sadin). Sobre o ketonet, os mais proeminentes usavam uma
simlá, espécie de manto, ao passo que o resto do povo usava a abayá, que servia
para aquecê-los à noite. Os profetas usavam sobre as vestes um tipo de toga,
sem mangas, como símbolo de seu poder profético. Reis e líderes por sua vez
usavam uma espécie de túnica, o me'il. Confeccionado em tecidos leves, e
chegando à altura dos joelhos, assemelhava-se ao manto usado pelo Sumo
Sacerdote.
Na época, como grande parte das roupas tinha quatro
cantos, o tsitsit não constituía uma peça de vestuário separada, para cumprir o
mandamento bastava aplicar as franjas nas roupas usuais.Os trajes eram feitos
em lã ou linho, sendo o algodão introduzido posteriormente. Uma das primeiras
menções a esse tecido apenas surge na Meguilat Esther. Os tecidos geralmente
conservavam os tons naturais da fibra; somente as roupas dos dignitários e dos
mais abastados eram tingidas de púrpura, vermelho ou violeta.
As vestes mais elaboradas eram sempre as
cerimoniais, principalmente as utilizadas durante o serviço no Templo. Os
trajes e turbantes dos Cohanim para oficiar no Templo de Jerusalém eram
especiais, principalmente os do Cohen Gadol. Enquanto oficiava, o Sumo Sacerdote
usava, além do me'il, o efod, que era uma veste tipo avental usada sobre as
demais e, sobre este, um peitoral ornado com 12 pedras preciosas onde estavam
gravados os nomes das 12 tribos. Durante os serviços de YomKipur, lê-se a
descrição detalhada das quatro diferentes vestimentas que o Sumo Sacerdote
usava no Dia do Perdão. Cada peça de seu vestuário revestia-se de profunda
simbologia espiritual.
As mulheres na antiga Israel usavam algo similar ao
ketonet e à simlá. Eram, porém, peças bem mais longas e mais largas, sempre com
mangas. As roupas das mais abastadas eram ricas e perfumadas. Em certas
ocasiões, como no dia do casamento, as mulheres usavam véus. Para proteger os
pés quando saíam de casa, usavam sandálias de couro, na'alayim. Na época,
caminhar sem sandálias era sinal de pobreza extrema.
Início da Grande Diáspora
A partir do ano 70 E.C, quando os judeus, expulsos
por Roma da Terra de Israel, começam a se espalhar pelo mundo, suas vestimentas
prontamente mudam, passando a refletir a vida no exílio. Obrigados a viver como
minoria no seio de uma sociedade maior, raramente acolhedora, eles
desenvolveram formas diferentes de se trajar, dependendo dos costumes
circundantes - fossem estes islâmicos ou cristãos - e das restrições que
freqüentemente lhes impunham.
Foi a partir do século 9, nos países sob domínio do
Islã, e do século 13, nos países cristãos, que os judeus foram obrigados ao uso
de roupas e distintivos especiais. O objetivo era torná-los facilmente
reconhecíveis e, ademais, servir de "lembrete constante" de sua
posição de "inferioridade".
Várias fontes, judaicas ou não, nos dão uma idéia
sobre o trajar judaico durante a Idade Média e Moderna. São fontes literárias,
documentos jurídicos, decretos de autoridades civis e religiosas, regulamentos
internos das comunidades, bem como relatos de viajantes. Há, também, fontes
visuais, principalmente as iluminuras encontradas em hagadot e sidurim, que são
um retrato fiel da vida judaica na época medieval. Não podemos descartar os
trabalhos de artistas cristãos, pois apesar da forma extremamente negativa de
nos retratar, eles reproduzem as vestimentas de nossos irmãos na Europa cristã.
Bastante úteis, também, são os relatos e ilustrações de viajantes e artistas
que, a partir do século 15, registraram os trajes usados por judeus da Europa,
Norte da África e Império Otomano.
Sob o domínio do Islã
No século 7, com a expansão do Islã, a maior parte
da população judaica mundial passou a viver sob seu controle político e
influência cultural. O Estado islâmico lhes concedera estatuto de dhimmis. Isto
permitia a judeus e cristãos viverem em terras muçulmanas mediante o pagamento
de impostos especiais. Na realidade, os dhimmis eram
cidadãos de segunda classe, sobre quem podiam ser aplicadas inúmeras leis
destinadas a rebaixá-los, social e economicamente. As restrições e imposições variavam
muito, pois sua aplicação dependia da vontade de cada governante muçulmano.
Estes podiam revogá-las ou aplicá-las, com maior ou menor severidade,
dependendo de seus interesses e grau de fanatismo e, até mesmo, de seu humor.
Entre outras exigências, a lei islâmica determinava o uso de trajes
diferenciados para os não-muçulmanos. Uma das primeiras medidas foi obrigar os
judeus a usar uma tira de pano amarelo em suas roupas. Com o passar do tempo,
as restrições foram aumentando.
As cores que judeus e outras minorias
não-muçulmanas podiam usar em seus trajes eram também determinadas pelos
governantes muçulmanos. Era proibido usar roupas verdes, a cor do Islã,
reservada aos nobres e dignitários. Em geral, os judeus eram obrigados a usar
cores mais escuras. Por exemplo, na Turquia, Mesopotâmia e na então Palestina
podiam usar violeta, vinho e marrom; no Marrocos, preto; e, na Tunísia, além do
preto, o azul. No século 14, os mamelucos obrigaram os cristãos a se vestir de
azul e os judeus de amarelo, cor associada à "vergonha" desde a
Antigüidade.
Era permitido o uso de turbantes aos judeus e
cristãos, sempre obedecendo o código de cores e tamanhos prescrito pelas
autoridades. Peça de indumentária típica do Oriente, os turbantes revelavam a
posição social e a condição econômica de quem os usava. Os dos judeus eram
geralmente amarelos. Mas, o adorno de cabeça mais comum era o qalansuwa,
parecido com um fez, cuja cor também era determinada. No século 17, na Pérsia,
os judeus foram obrigados a usar um chapéu de feltro semelhante ao usado pelos
escravos.
Na Espanha islâmica, foram raras as restrições
adotadas contra os judeus, inclusive em relação ao vestuário. As classes
espanholas mais privilegiadas, fossem muçulmanas, judias ou cristãs, vestiam-se
com igual elegância e riqueza, com roupas de seda e outros tecidos finos.
Usavam mantos de cores diversas, como verde, laranja ou rosa. E os turbantes
foram sendo gradativamente substituídos por uma espécie de gorro de lã, em
verde ou vermelho. Os judeus geralmente os usavam em amarelo.
Império Otomano
Do surgimento do Império Otomano, no início do
século 14, até sua queda, no final do século 19, era enorme a variedade de
estilos utilizados pelos judeus que viviam em suas terras. Havia, porém,
algumas determinantes. Os Sultões exigiam que houvesse uma clara diferenciação
nas roupas dos muçulmanos e não-muçulmanos. Além de não poder usar verde e
serem obrigados a usar cores escuras, os tecidos e enfeites usados por todos
que não haviam aceito o Islã tinham que ter qualidade inferior e menos luxuosa
do que os dos muçulmanos. Os trajes deviam mostrar claramente sua qualidade
inferior. O feitio e tamanho dos turbantes também obedeciam regras específicas.
Na Turquia, o traje dos judeus se distinguia pelo
turbante negro e pelo antari, uma espécie de túnica aberta na frente, com
mangas compridas e largas, com um cinturão que dava duas voltas na cintura. Por
cima do antari, ainda usavam um redingote comprido, o jubá, forrado de pele de
coelho. Feita em seda, esta peça costumava ser bordada, para as cerimônias
festivas. Sob a túnica, usavam calças bufantes, ou chalouar. O fez, ou tarbush,
um pequeno chapéu de feltro cônico, tornou-se muito popular em todo o Império
Otomano, principalmente após ser incorporado ao traje oficial do governo.
Os trajes para casamento, tanto masculinos quanto
femininos, eram coloridos e bordados com fios de ouro e levavam sobreposta uma
espécie de túnica redingote. Em Salônica (Grécia), o traje típico das noivas
conseguiu resistir às influências ocidentais até o século 20.
As comunidades judaicas do Marrocos são as que
possuem os figurinos mais variados. Os trajes festivos se caracterizam pelo uso
de veludos, brocados e sedas. Percebe-se forte influência espanhola,
principalmente no vestido usado sob a chupá por grande parte das noivas
marroquinas. Chamado de El Gran Vestido, ou pelo seu nome árabe, El-keswa
El-kebira, o vestido das noivas era rico e elaborado.
Consistia, em, geral da zeltita, uma farta
saia-envelope comprida, em veludo de seda vermelho-escarlate ou amarronzado,
ricamente bordada com fios de ouro, por vezes com pedras semi-preciosas
incrustadas. Na parte superior, um corpete em veludo da mesma cor da saia, o
gombazh, também bordado. Por baixo desse colete, surgiam as kemamet-tesmira, longas
mangas bufantes, em diáfana seda tramada com fios de ouro. Completava o traje
um cinturão largo, que podia ser ricamente trabalhado em fios e pérolas. O
arranjo da cabeça variava. Podia ser uma espécie de turbante formado por lenços
coloridos, uma coroa em prata incrustada de pedras preciosas ou tiaras
bordadas. E levava um festul, uma longa écharpe de seda branca ou verde,
recoberta por um pequeno véu branco transparente, o elbelo, que recobria o
rosto da noiva ao ser entregue ao noivo. (Ver Morashá nº 55).
No dia-a-dia, o judeu marroquino usava um caftã
preto (djelabia) e na cabeça um tarbush sempre em cor escura. Por baixo dessas
roupas, usavam trajes coloridos. As calças eram largas e bufantes, até os
joelhos, e, por cima, um colete liso. O zocha, redingote preto, era usado pelas
classes mais abastadas, em lugar do caftã. As mulheres usavam roupas brancas e
vermelhas, múltiplas saias, xales bordados para cobrir a cabeça, além de jóias
vistosas, como colares e braceletes largos.
Na Síria, até o início do século 20, os homens -
fossem judeus, muçulmanos ou cristãos, usavam um imbazz ou yallak, uma espécie
de caftã de algodão que chegava aos tornozelo. Em ocasiões festivas era em
jacquard, às vezes com discretos fios de ouro ou prata. Nos meses mais frios,
por cima do imbazzusavam um jibbeh, um tipo de capa de material mais pesado. Os
mais proeminentes - como rabinos ou outros líderes religiosos, sempre usavam o
jibbeh. Os trabalhadores usavam shirwal, uma calça bufante que chegava até o
tornozelo, com uma camisa por cima. Na cabeça, os homens das classes menos
abastadas usavam um turbante simples, o laffe. Rabinos e outras autoridades
religiosas também usavam turbantes, mas bem mais elaborados. Muitos homens
usavam na cabeça o tarbush cônico, em feltro vermelho ou vinho, estruturado
para manter o formato. O fez usado em Alepo era bem mais alto, do tipo usado no
Egito, Marrocos ou Tunísia.
Na Síria, os trajes típicos foram abandonados pelos
judeus, principalmente pelas classes mais abastadas, assim que os costumes
ocidentais passam a influenciar o país, no final do século 19. Os homens usavam
ternos, mas a maioria manteve o uso do tarbush e, as mulheres, roupas e chapéus
no estilo usado na Europa. As mais abastadas usavam roupas sofisticadas "à
lamode de Paris".
Em algumas repúblicas muçulmanas remanescentes da
antiga União Soviética, os judeus mantiveram traços das vestes tradicionais -
pelo menos até emigrarem para Israel, na década de 1990. Oriundas do campo,
estas populações aperfeiçoaram a arte do bordado da lã sobre seda, produzindo
casacos, ternos masculinos, ou maaraz, sofisticados vestidos e longos xales
usados ao redor da cintura ou como turbante. Um exemplo são os judeus de
Bucara, com seus pesados casacos e caftãs de veludo bordado em ouro e pedrarias.
No Afeganistão e na Pérsia, os judeus se vestiam
segundo os costumes locais. Antigamente, o traje comum compunha-se de calças
justas e camisas bordadas com temas florais, cobertas por um chador, como ainda
fazem as mulheres muçulmanas. Cobriam também a cabeça com xales de algodão ou
em lamê, quando estavam em casa. Os homens usavam um turbante ou chapéu cônico.
Na Líbia, era o véu o elemento que diferenciava as
mulheres judias das muçulmanas. As primeiras deixavam os dois olhos à mostra e,
as segundas, apenas um. Já as judias argelinas mantiveram o uso de alguns
trajes tradicionais em determinadas ocasiões, entre os quais lindos vestidos de
musselina, coletes bordados com fios de ouro e lenços de cabeça ricamente
trabalhados.
Na Europa cristã
Durante o feudalismo e a Idade Moderna, as roupas
assumiram um papel político-social: indicavam a classe social de quem as usava.
Do séculos 16 ao 18, os tecidos bordados e luxuosos ainda eram privilégio
exclusivo da aristocracia. A partir do século 13, as autoridades eclesiásticas
e os governantes começam a exigir dos judeus um vestuário específico. As
exigências variavam de acordo com o contexto social, as tendências políticas, o
grau de anti-semitismo e, sobretudo, os interesses financeiros dos governantes.
No ano de 1215, o Quarto Concílio de Latrão
determinou o uso de um emblema para que os judeus fossem facilmente reconhecidos,
"evitando assim o contato sexual entre cristãos e judeus". O infame
"Distintivo amarelo da vergonha" consistia em um pedaço de pano de
diferentes formatos, costurado no casaco. Com algumas variantes, seu uso
tornou-se obrigatório na França, Inglaterra, Polônia, Hungria, Alemanha,
espalhando-se também por outros países. Em 1267, o Concílio de Viena determinou
que os judeus usassem roupas escuras ou pretas. Em muitos países, foram
obrigados a usar o Judenhut, o "chapéu do judeu". De formato cônico, bem
pontudo e amarelo, tinha o objetivo de ridicularizar os usuários, tornando-os
objeto de escárnio popular. As mulheres eram obrigadas a usar chapéus com duas
pontas, o Cornélia. Em sinal de excepcional deferência, alguns judeus
proeminentes eram isentados do uso do infame acessório.
Outro fator determinante do traje dos judeus na
Europa foi a regulamentação interna de cada comunidade. Como tentativa de não
despertar a inveja e o ódio nos cristãos, várias comunidades judaicas proíbem
seus membros de se vestir de forma requintada ou ostensiva. Era proibido o uso
de jóias e tecidos mais nobres, como seda e brocado.
Os judeus ibéricos, mais uma vez, foram um caso à
parte, pois mesmo após a Reconquista - quando a região voltou para mãos cristãs
- e até serem expulsos da Espanha, em 1492, e de Portugal, em 1497, não
sofreram nenhum tipo de imposição às suas vestimentas. Os mais abastados usavam
roupas semelhantes às da realeza e das elites, incluindo pelerines e chapéus
achatados para os homens. As mulheres, por sua vez, vestiam saias de seda e
brocados com laços e cobriam a cabeça com véus curtos.
Idade Contemporânea
Foi somente durante a Revolução Francesa, em 1789,
que se aboliu o uso do distintivo, considerado pelos revolucionários "a
vergonha" não dos judeus, mas da Europa. O exemplo da França espalhou-se
rapidamente por todo o continente, à exceção da Inglaterra, onde o distintivo
já deixara de existir um século antes, quando os judeus foram oficialmente
readmitidos no país.
Com o início do processo de emancipação, foram
desaparecendo as medidas que impunham vestimentas diferenciadas aos judeus, nos
países da Europa Ocidental. Mas, para grande vergonha do Ocidente, o uso do
distintivo judaico foi ressuscitado em setembro de 1941, pelos nazistas, sob a
forma de uma braçadeira com a Estrela de David amarela, ostentando a palavra
Jude no centro. Todos os judeus da Alemanha e do resto da Europa sob domínio
nazista foram obrigados a usá-la enquanto durou o Terceiro Reich.
Atualmente, a maior parte dos judeus, mundo afora,
veste-se ao estilo ocidental. Somente certos grupos chassídicos preservam os
trajes usados no shtetl - pequenos vilarejos da Europa Oriental. Suas
vestimentas de Shabat consistem, até hoje, de um chapéu de pele, o shtreimel,
pesados casacos pretos fechados na lateral, chamados bekeshe, e meias brancas
grossas e altas.
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